Devagar com toda essa vontade de julgar
Tenho ensaiado uma volta a esse blog tanto e tantas vezes que nem sei. Nas últimas semanas a ideia tem sido mais forte, mas estou em uma licença médica que me permite usar computador só uns quarenta minutos por dia – e com ressalvas – então achei que poderia não ser o momento mais adequado. Até eu tropeçar nesses quarenta minutos em uma matéria sobre o caso da Essena.
Se você estava em Marte, eu dou o resumão: Essena é dona de uma conta de Instagram super famosinha daquelas que olhamos e assistimos a vida, o corpo, as roupas, os amigos e as festas que queremos ter. Só que Essena se encheu, deletou quase todo o conteúdo onde comprar bitcoin em portugal e trocou suas legendas por legendas mais verdadeiras sobre as condições em que aquelas fotos foram tiradas. E assim ela acaba de virar tema de vários posts muito interessantes sobre as mentiras Instagramadas – o meu favorito até agora é o da Carol Burgo. A primeira vista isso tudo parece muito bom, mas querem saber? Me preocupa. Porque eu vejo o caminho que isso tomará em poucos cliques. Um caminho de julgamento que eu mesma já tomei e que não acho o mais saudável já faz um tempo.
será que todo mundo que tira selfies merece ser visto como a Essena definiu?
Se você é uma mulher ocidental de classe média, é bem provável que essa frase te faça sentido: desde que nascemos somos treinadas para princesinhas do baile. Nossas metas são o corpo, a vida e a casa mais bonita, o casamento mais feliz e os filhos mais fofos. Se você também cresceu na minha geração, a essas pressões se somam outras porque a gente também tem que ter trading portugal um bom emprego, viajar, ser inteligente e descolada, desprendida, espiritualizada… Ufa! São muitos papéis que fazem não com que atinjamos a perfeição mas com que a gente possa garantir um direito de tentar ser feliz. Para piorar essa pressão toda, aparecem contas como a da Essena, de pessoas que confundem inspirar com falsificar a realização dessas cobranças, e nós nos deprimimos por não cumprirmos essas exigências que elas parecem cumprir. É uma pressão realmente desnecessária, eu concordo. E mais horrível ainda é quando alguém como ela vem nos dizer que era tudo mentira e que sofremos à toa.
Mas a questão é que nós somos treinadas a perseguir essa beleza, uma tal de beleza ideal. Mas perseguir não significa alcançar – nós nunca podemos alcançar, nunca podemos dizer em voz alta que achamos que alcançamos. É rude. É rude se dizer bonita, é rude admitir que sua casa é bem decorada, é rude dizer que você está feliz pra caramba com seu emprego, que seu salário se basta e que sua viagem foi realmente sensacional. Isso acontece porque a beleza é uma forma de controle feminino: nós somos válidas apenas quando nos dizem que somos bonitas, mas nunca podemos nos sentir bonitas pra nunca pararmos de procurar essa validade dada pelos homens. Mas se você, como eu, considera que tudo isso é muito relativo e que casas, viagens e vestidos bonitos não dizem respeito ao que outros definiram mas ao que você sente, vai perceber que rude não é ser assim ou assado: rude é a felicidade. E a maior prova disso são as it girls que definem novos conceitos de beleza e passam a ser acusadas de fúteis logo em seguida – ou você não percebe que o vestido, a maquiagem e o destino da moda mudam todo ano mas as @s odiadas continuam sendo as mesmas?
E é por isso que eu sinto que isso tudo que a Essena está ensinando agora é a ter culpa: culpa por tirar fotos bonitas, culpa por se sentir bonita, culpa por demonstrar felicidade. Sim, eu entendo e concordo que o que ela diz quando ela fala que uma menina de 15 anos deve se preocupar com mais do que malhar muito e comer pouco para ter a foto perfeita, mas eu não senti ela apontando um caminho para que essas meninas se olhem no espelho e se amem, mas apenas acusando todo mundo que curte as coisas que ela postava de fútil, falso e mentiroso. Poxa, é o mesmo tipo de julgamento fútil mas com valores invertidos apenas.
Essena pergunta “Por que mais euteria postado essa foto?”. e eu respondo: se somos todas diferentes, nem todas temos a mesma resposta de Essena para postar nossa foto de biquini.
Eu vejo no discurso dela palavras de ódio e acusações muito pesadas, e isso me entristece, porque isso pra mim é só uma outra forma de odiar mulheres. Eu não sou nenhuma princesa da disney, não acho que não existe dor e tristeza no mundo e não acho que meus problemas são os mais difíceis que existem. Mas eu não gosto de expô-los tanto quanto gosto de expor uma foto em que eu me sinto bonita ou de um lugar bacana em que eu estou. Isso não é uma novidade, antes mesmo da internet os albúns da minha família eram das festas e das pessoas em roupas bonitas e não das visitas aos hospitais e velórios. Isso não significa que ninguém estava mentindo sobre ser feliz, apenas que não estavamos afim de eternizar a infelicidade. Ninguém está.
Todos querem buscar beleza, e eu realmente acho que a beleza não é uma distração ou um problema, não denota menos inteligência eu acho que é um direito de todos. Sim,dá pra ser zen e se sentir bonita, sim, dá pra gostar de decoração e ler filosofia alemã ao mesmo tempo. Nada nem ninguém tem direito de limitar o tipo de mulher que somos ou de colocar rótulos e caixas em toda nossa existência por causa de uma foto no Instagram. Ninguém precisa viver na caixa da fútil ou da inteligente, dá desesperada ou da espiritualizada. Somos tantos tons de cinza no meio desse preto e branco…
E sabe por que tudo isso é perigoso? Porque se disfarça de um empoderamento feminino que é falso e medíocre. Já faz um tempo que li sobre como, por a beleza ser uma meta cobrada das mulheres, ela foi diminuída como algo frívolo e sem significado. Associa-se tudo que é feminino ao burro e sem valor assim como se criam ofensas do tipo “mulherzinha”, esse é o truque mais velho do livro para fazer com que nós nos odiemos e aceitemos os rótulos e aprovações oferecidos. E é assim que artes como a moda e a maquiagem são tidas como artes menores pelo simples fato de serem ‘coisa de menininha’. Desculpa, mas eu acho que expressar quem você é, o que você ama, o que você deseja com suas roupas e atitudes e escolhas é lindo. Eu não acho que isso deveria ser recriminado de maneira alguma.
O que eu quero dizer é que eu sei que quando a gente lê o depoimento da Essena se sente um lixo com essas acusações todas de materialismo e frivolidade, a gente sente vontade de deletar tudo que tem no nosso Instagram pra não ter uma vida falsa na luz perfeita. E esse sentimento não tem nada de diferente ao sentimento que temos quando vemos um Instagram perfeito e odiamos a nossa vida: ambos são uma necessidade de adequação para receber aprovação.
Amiga, seja em pose de ioga na praia que você ficou feliz de fazer então fotografou ou seja de pijama e descabelada em casa, uma coisa é muito verdade sobre a vida: você não precisa se odiar nem fazer absolutamente nada pra passar a impressão a ou b pros outros. Você não precisa parar de tirar selfies e de se sentir bonita para ser uma pessoa melhor. Este não é o ponto.
Inteligência não é se desligar da beleza, mas se informar, criticar e raciocinar. Espiritualidade não é repudiar todo mundo que tira foto fazendo yoga, mas fazer o que te completa, se conectar com o que te atrai e deixar esses julgamentos para trás. Não existe fórmula do bolo, mas decididamente tem mais a ver com o que você faz do que com as regras do que não fazer que você eventualmente cria.
A beleza do seu rosto, do seu corpo, da sua casa, das suas viagens e das suas fotos é sim um direito seu, desde que seja seu. Antes do clique, é preciso pensar se ele existe para validar você, para contar os likes e estimar quão amada você é, ou porque você realmente quer curtir e eternizar aquilo tudo em uma foto bonitinha. E, claro, se você está mentindo sobre o que posta é um sintoma bem grande de que a validação alheia seja sua motivação. E aí sim é hora de você apertar o botão vermelho – mas aperte-o por você e não para parecer alguém mais evoluído na rede social. Não deixe evolução ser o novo projeto verão da cobrança.